Infecção urinária na mulher
O trato urinário, formado pelos rins, pelve renal, ureteres, bexiga e uretra é um importante alvo de invasão de microorganismos. A infecção do trato urinário (ITU) em mulheres em idade reprodutiva é a Segunda mais comum, perdendo apenas para a gripe. A maioria dessas infecções não atingem os rins, permanecendo confinadas à bexiga (cistite). Neste texto abordaremos apenas a cistite aguda bacteriana na mulher, que é, disparadamente, a ITU mais comum.
Cistite aguda bacteriana é a invasão da bexiga por bactérias e a sua conseqüente inflamação. Considera-se episódica quando ocorre até três vezes em um ano e recorrente quando ocorre mais de três vezes em um ano, ou mais do que duas vezes em seis meses. Em média, 10 a 20% de todas as mulheres desenvolverão uma ITU em alguma época de suas vidas. As mulheres têm 30 vezes mais cistite que os homens, principalmente por terem a uretra mais curta (5 cm) comparada com a uretra masculina (22 cm). Cerca de 4 em cada 5 mulheres que têm ITU, desenvolverão outro episódio infeccioso em 18 meses. Sua freqüência é maior em mulheres sexualmente ativas dos 15 aos 50 anos de idade, mas pode ocorrer em mulheres sexualmente inativas e até em meninas.
Normalmente, a urina da bexiga é estéril e as bactérias que conseguem vencer os mecanismos naturais de proteção e chegar à bexiga são expulsas pela micção. O ato de urinar é um dos mais importantes mecanismos de defesa contra a proliferação das bactérias que invadem a bexiga, pois estas são eliminadas à micção. Se as bactérias multiplicarem-se mais rapidamente que a capacidade da bexiga em expulsá-las pela micção, a infecção acontece. As principais bactérias causadoras da cistite são a Escherichia coli e o Staphylococcus saprophyticus, habitualmente presentes na flora intestinal e da região em torno da uretra (periuretral), do vestíbulo vaginal (parte externa da vagina) e ao redor do ânus. O principal meio de acesso destas bactérias à bexiga é a via ascendente; ou seja, as bactérias da própria paciente “sobem” da região periuretral, vagina ou ânus até a bexiga.
Alguns fatores, isolada ou conjuntamente, são necessários para que ocorra a infecção urinária na mulher, na bexiga:
- Colonização periuretral pelos micro-organismos provenientes da flora intestinal por fatores como defecação, sudorese e higiene pessoal inadequada.
- Fatores relacionados ao modo como certas bactérias se aderem à região periuretral.
- O intercurso sexual é um dos fatores mais importantes da cistite em mulheres, pois, através dos movimentos de penetração, facilita a introdução de bactérias da região periuretral até a bexiga.
- Os fatores naturais de proteção tais como a acidez natural da urina, o muco vesical e a secreção local de imunoglobulinas precisam ser sobrepujados para que ocorra a infecção.
Além disso, existem muitos outros fatores de risco contribuem para o desenvolvimento da cistite:
- Alterações da imunidade geral e local da região periuretral e da bexiga.
- Diabetes.
- Banhos de imersão.
- Certos antibióticos que destroem temporariamente a flora bacteriana protetora, que compete com a Escherichia coli e outros microorganismos implicados na cistite.
- Alergia a componentes usados em produtos de higiene íntima tais como sabonetes, cremes, loções, óleos, sais para banho etc.
- Anormalidades obstrutivas ou estruturais do trato urinário como fístulas, cistocele, divertículo da uretra, tumores, estreitamentos, cálculos etc.
- Gravidez, onde o risco para o desenvolvimento de cistite é dobrado.
- Menopausa.
- Uso de sonda uretral ou instrumentação das vias urinárias.
- Atividade sexual freqüente aumenta o risco de cistite.
Cerca de 80% dos casos ocorrem nas 24 horas que se seguem ao coito. Um súbito aumento da freqüência da atividade sexual aumenta o risco de cistite, especialmente se a mulher usar diafragma. Mulheres que se relacionam sexualmente pela primeira vez ou que o fazem intensa e frequentemente, especialmente após um período longo de abstinência, podem desenvolver cistite. Esses casos são chamados de “cistite da lua-de-mel”. Preservativos não-lubrificados traumatizam as paredes vaginais e aumentam o risco de cistite.
A cistite aguda bacteriana costuma ser bastante incômoda e, não raro, faz com que a paciente procure ajuda médica prontamente. O quadro clínico é bastante característico, embora não seja exclusivo. Os sintomas predominantes são: disúria (micção dolorosa, ardência ou queimação uretral ao urinar), polaciúria (micção freqüente, em pequenas quantidades e em curtos intervalos), urgência miccional (desejo forte, repentino e urgente de urinar), dor hipogástrica (região da bexiga, acima do púbis), hematúria (urina sangüinolenta). Febre é ocorrência rara. Pode haver apenas um, alguns ou todos os sintomas descritos. Os sintomas da cistite aguda bacteriana no homem são os mesmos, embora sua ocorrência seja rara no sexo masculino.
O tratamento da cistite aguda bacteriana visa aliviar o desconforto causado pela inflamação da bexiga e erradicar as bactérias causadoras, impedindo sua perpetuação ou ascensão até os rins, provocando uma infecção muito mais séria.
A maioria dos casos pode ser tratada ambulatorialmente, sem necessidade de internação hospitalar. Como medidas gerais, recomenda-se ingestão abundante de líquidos (2 a 4 litros/dia) para aumentar a diurese e diluir a população bacteriana, bem como micções completas e repetidas para esvaziar a bexiga; evitar ingestão de bebidas irritantes para a bexiga como álcool, refrigerantes e café; abstinência sexual enquanto durar a fase aguda; higiene genital e perineal meticulosas; visitar o ginecologista para tratar possíveis corrimentos ou inflamações vaginais concomitantes.
Em geral, o tratamento medicamentoso é bastante eficiente e consegue o alívio dos sintomas em 24 horas e a cura completa do episódio em mais alguns dias. Quando a cistite aguda é recorrente, naquelas pacientes em que o ato sexual for identificado como fator importante para sua ocorrência, o urologista poderá instituir tratamento preventivo prescrevendo o esvaziamento completo da bexiga após o coito e a ingestão de pequenas doses de antibióticos específicos, logo após o ato sexual.
A adoção de algumas medidas pode ajudar na prevenção da cistite aguda, infecção urinária na mulher, principalmente nos casos recorrentes. Ei-las:
- Tomar banho de chuveiro em vez de banho de imersão (banheira).
- Lavar os genitais e períneo com água e sabonete após defecar ou urinar.
- Fazer a higiene anal no sentido vagina-ânus, jamais no sentido ânus-vagina.
- Evitar o uso de sprays, desodorantes, perfumes ou duchas íntimas.
- Procurar o ginecologista aos primeiros sinais de corrimento ou inflamação vaginal.
- Tratar a prisão de ventre, se houver.
- Evitar o uso de calças apertadas (jeans); preferir o uso de roupa íntima de algodão.
- Alimentar-se corretamente; ingerir frutas, verduras, legumes e outros alimentos ricos em fibras.
- Beber muito líquido, para promover um aumento da diurese e conseqüente aumento da freqüência urinária, que ajuda a expulsar (lavar) bactérias da bexiga. Para tanto, quaisquer líquidos, exceto os irritantes para a bexiga, são indicados (água, água de coco, chás, sucos, refrescos etc.).
- Evitar bebidas irritantes para a bexiga tais como café, álcool e refrigerantes.
- Procurar obedecer os avisos de esvaziar a bexiga. Quando a vontade de urinar manifestar-se, evitar prender, segurar ou adiar a micção por muito tempo. Quanto mais tempo a urina com bactérias permanecer dentro da bexiga, mais tempo de multiplicar-se terão estas bactérias.
- Antes do ato sexual, esvaziar parcialmente a bexiga. Deixar de 30 a 50% de sua capacidade para promover uma espécie de “almofada d’água” que amortecerá o impacto do pênis sobre a uretra e base da bexiga.
- Urinar imediatamente após o coito, para esvaziar a bexiga e eliminar bactérias que possam ter sido introduzidas durante o ato sexual.
- Fazer adequada higiene perineal e genital antes e após o ato sexual.
- Evitar o uso de preservativos não-lubrificados.
- Seguir as orientações do seu médico quanto ao tratamento de outras enfermidades existentes.
A cistite aguda bacteriana, principalmente a recorrente, poderá ser importante aspecto comprometedor da qualidade de vida de um sem número de mulheres. Portanto, sua ocorrência merece pronto reconhecimento e adoção das medidas necessárias para seu combate. A participação do urologista é fundamental para o correto estabelecimento do diagnóstico, triagem dos casos que necessitam de acompanhamento e orientação especializadas, bem como para vigilância e prevenção das recidivas.
fonte: drandre.site.med.br